sábado, 3 de fevereiro de 2018

Mexendo nos porões da alma, deixo de falar ao vento e descubro um pouco mais de tudo que passa em meu peito e ele canta outra vez. As farpas deixam de existir para ouvir a melodia! ___________________________ Denise Portes

Vinícius de Moraes era um apaixonado compulsivo. Necessitava da paixão para sentir-se vivo, à flor da pele, completo. Porém, além das aparências, era bastante sozinho. Certa vez deu uma entrevista à Clarice Lispector falando desse sentimento. “Clarice : Vinícius, você já se sentiu sozinho na vida? Já sentiu algum desamparo? Vinícius: Acho que sou um homem bastante sozinho. Ou pelo menos eu tenho um sentimento muito agudo de solidão. – Isso explicaria o fato de você amar tanto, Vinícius.” A gente entende o amor romântico de uma forma muito errada. Colecionamos frustrações porque fomos programados para acreditar numa fórmula de amor que não existe: o amor como solução de todas as nossas dúvidas e problemas; o amor como o encontro perfeito entre duas pessoas; o amor como a concretização da felicidade; o amor como doador daquilo que nos falta. Quando nos apaixonamos, é assim que funciona. A sensação é que finalmente seremos felizes para sempre, como nos contos de fadas. O problema é que desconhecemos a verdade. A verdade é que ninguém completa ninguém _ somos criaturas intrinsecamente solitárias. E faz parte da nossa natureza jamais nos sentirmos completos. Isso sempre será fonte de angústia, estejamos acompanhados ou não. Costumamos ser injustos com quem amamos cobrando o preenchimento de nossos vazios interiores, como se isso fosse possível. Não é. O amor traz um trago, um afago, alento, cuidado, conforto, consolo… mas não garante o fim de nossas inquietações. Quando buscamos nas coisas ou em alguém o fim de nossas precariedades, exigimos que essa pessoa _ coitada!_ seja para nós remédio, remendo e cura. Depositamos nela todas nossas esperanças e passada a euforia inicial, nos frustramos. Cobramos, controlamos, exigimos. Concluímos que a pessoa mudou, não nos satisfaz mais. Queremos nos sentir novamente nas nuvens, eufóricos, perdidamente apaixonados _ como um vício. É que a solidão não vai embora. Ela permanece; e só é camuflada por instantes, por momentos de absoluta distração de nós mesmos. Nos distraímos com um amor, um esporte, uma oração, nossos filhos, amigos, trabalho, prazeres. Mas quando acaba o expediente, as luzes se apagam e a música cessa, voltamos a ser só nós. Nós, e aquilo do que somos feitos: bem e mal, dúvida e fé, prudência e impulsividade, saudade e intolerância, paixão e comodismo, sagrado e profano. Nossas solidões são compostas de nuances, nem sempre íntegras, nem sempre belas; simplesmente composições de nossa essência…Schopenhauer, em “Aforismos para sabedoria de vida”, diz que é na solidão que revelamos e sentimos quem realmente somos. Assim diz ele: “na solidão o indivíduo mesquinho sente toda a sua mesquinhez, o grande espírito, toda a sua grandeza; numa palavra: cada um sente o que é”. Muitas vezes nos apegamos a um amor que não existe mais ou à uma dor antiga porque de certa forma essa dor nos completa também. São emoções que mantém nossa cabeça, corpo e coração preenchidos, ainda que de forma torta. Nos apegamos àquele sentimento e cuidamos para que não morra dentro de nós. Alimentamos o caso que não deu certo, a mágoa que já expirou, a lembrança com validade vencida. Assim como Vinícius, temos sentimentos muito agudos de solidão.Podemos lidar com os nossos, colecionando romances como ele ou_ a exemplo de Clarice e da maioria das mulheres que conheço_ nos conectando com o que há de invisível e sagrado em nós…“Que minha solidão me sirva de companhia, que eu tenha a coragem de me enfrentar. Que eu saiba ficar com o nada e mesmo assim me sentir como se estivesse plena de tudo”(Clarice Lispector)




Fabíola Simões

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