quarta-feira, 26 de agosto de 2020

Às vezes (demasiadas vezes) eu tenho vontade de ser menos intensa, só para poder entender como o resto do mundo aguenta essas coisas que me devoram permanentemente e de uma forma tão absurda... (Clarice Lispector)

Ainda te choro, assim do nada. Uma música que toca e és tu quem ali está a cantar-me. Apareces-me e levas-me para aquela tarde estranha em que não queríamos mais estar zangados, mas não sabíamos como fazer as pazes. E então a música tocou. E foi mais fácil pedir-te colo. E foste mais rápido em me dar. No outro dia até te chorei através do choro de uma amiga e das dores que lhe andavam a fazer no peito. Como as que achei que nos fizemos um ou outro. Lembrei-nos a avançar milímetros na mesma direção, para depois recuarmos quilômetros em sentidos opostos. Mas demos por nós mais perdidos sozinhos do que a desbravar um caminho juntos. E voltamos para trás. Encontramo-nos ao meio e demos de novo as mãos. Até que as largamos de vez porque a promessa de mudança foi deixando de bastar para o regresso a Casa a cada volta cada vez mais longa... Tenho-te chorado mais agora, assim do nada, porque não morreste simplesmente. Fomos cúmplices no homicídio lento da vida que havia em nós. E como são pesadas as lágrimas de saudade quando carregadas de paixão e amor...


IdoMind  

sexta-feira, 21 de agosto de 2020

Posso nao saber para onde irei. Mas sei bem para onde não mais voltarei... _________________________________________ Marcel Camargo

Img: Arquivo Pessoal
O futuro pode ser planejado, desejado, repleto de metas a serem alcançadas e, ainda assim, sempre será incerto, improvável, impossível de ser previsto com exatidão. No entanto, desejar e lutar por um amanhã melhor e mais feliz nos faz bem, alimentando nossas forças em sempre querer continuar, inesgotavelmente, haja o que houver. Nessa jornada, devemos estar seguros quanto ao que idealizamos, bem como quanto ao ontem e aos lugares a que não poderemos mais voltar, para nossa própria sobrevivência. Há lugares para onde nunca mais devemos voltar. Jamais. Não volte aos mesmos erros, aos conhecidos descaminhos, mas reaprenda com cada tombo, superando as próprias falhas e lidando saudavelmente com as limitações que todos temos. O ontem deve permanecer lá atrás, ancorando nosso aprendizado contínuo, de forma a redirecionarmos nossas energias em direção a acertos que nos tornarão cada vez mais humanos e mais felizes. Não volte ao lar que já se desfez, ao colo que não acolhe, ao vazio solitário de uma companhia dolorida. Devemos ter a coragem de colocar um ponto final em tudo aquilo que nos enfraqueceu e nos diminui, tolhendo-nos a tranquilidade de um respirar livre. O nosso caminho deve ser transparente e leve, sem pesos inúteis que atravancam o nosso ir em frente. Não volte às promessas quebradas, ao relacionamento fracassado, que em nada acrescentou na sua vida, ao incessante dar as mãos ao vazio, ao compartilhamento unilateral, ao doar-se sem volta. Todos merecemos nos lançar ao encontro de alguém verdadeiro e que seja repleto de recíprocidade enquanto se dividem os sonhos de vida. Todos temos a chance de encontrar uma pessoa que não retorne menos do que doamos, que não nos faça sentir a frieza da solidão acompanhada. Não volte aos amigos hipócritas, às pessoas que se baseiam em interesses escusos para permanecerem ao seu lado. Amizade deve ser soma, gargalhada, brilho nos olhos e ritmo no coração. 
Caso não nos faça a mínima falta, caso não nos procure sem razão, nenhum relacionamento pode ser tido como verdadeiro. É preciso poder contar com alguém que permaneça ao nosso lado, mesmo após conhecer nossas escuridões, pois é essa sinceridade que sustentará nossos ânimos nas noites frias de nossa alma. Não volte ao emprego desumano, que achata os sentidos, não reconhece seu valor, apenas criticando e pedindo sempre mais e mais, sem lhe dar nada em troca. Procure uma ocupação onde os minutos não pareçam uma eternidade, onde obtenha reconhecimento, onde possa atuar como personagem principal da própria vida. Não abra mão daquilo que você é, daquilo em que acredita, ou ninguém reconhecerá a grandeza que possui dentro de si. Sim, não há como prever o futuro, tampouco controlá-lo. Cabe-nos cuidar do nosso aqui e agora com todo o cuidado que o hoje merece, para que diariamente preparemos, aos poucos, um caminho menos árduo, um amanhã que dê continuidade aos nossos esforços em sermos felizes. Agirmos refletidamente, enfim, nos poupará de atravessar caminhos tortuosos e solitários, sob lamentações e arrependimentos. Porque, tendo plantado paixão verdadeira, tendo cultivado relacionamentos sinceros, colheremos, certamente, sorrisos e abraços de gente de verdade, gente com a intenção de ser feliz bem juntinho, sempre.
Marcel Camargo

segunda-feira, 17 de agosto de 2020

"Na minha vontade cabe um jardim. Uma casa toda branca com janelas azuis. Uma roseira no quintal e um girassol na porta de entrada. Cabe um amor limpinho morando dentro dela. Cabe eu e minha história, bordada de afinidades, amor e leveza." ________________________________ Cris Carvalho

" Quando a alma está no comando,
a sua vida se torna uma "história de amor"
Imagem:
Roseira plantada por mim no meu jardim...
Ansiamos por movimentos, para nos ligarmos com nossas almas.
Os monges encontram essa ligação no canto.
Os tuaregues, no deserto.
Os poetas, na palavra.
Os tocadores de tambor, na batida.
Eu a encontro nas flors!


Renata Lobo-Adaptado

 

domingo, 16 de agosto de 2020

Amélie finge gostar de estratagemas. Reconhecendo que não precisa de astúcia, pois guerra nenhuma, quiçá inimigo, existe, ela tem que confessar seu temor-na-verdade-covardia. E que esse ‘ser-diferente’, recalca uma mulher que não deixa-se capturar. Mais fácil resolver a vida dos outros, não?

"São tempos difíceis para os sonhadores"
O universo conspira favor do cinema-amor. Amélie não pára o filme inteiro. Seu ritmo é esse, acelerado. Amélie é um coração com pressa. Amélie não tem vocação para princesa. Amélie não é um anjo sem asas. Amélie é uma mulher comum de destino fabuloso por que partilha o mesmo com nós todos. Amélie é a moça com o copo de água. Aliás, por dentro, e fora, Amélie é água. Água com cheiro, com gosto, com cor. E existe isso? sim! Não enxergou ainda!? Amélie é cinema! 


(Fragmentos do Filme: O Fabuloso Destino de Amélie Poulain)

quinta-feira, 13 de agosto de 2020

"Quando a paixão não bate à porta entre invernos e verões a gente alimenta saudades (...)"

Ela sempre soube, mas preferiu ignorar os antigos manuais. Rasgou os argumentos de uma solidão conhecida e maquiou outros significados para ir além. Relevou algumas descrenças e desmascarou as ilusões. O plano parecia dar certo e torná-lo perigoso era empolgante. Enquanto desafiava a loucura, dissimulando os desejos, outros diziam que ela havia perdido a noção do risco. Aprendeu o  descompasso de um ritmo desconhecido e atormentou o silêncio da tristeza com um riso incontido. Jogou com algumas cartas camufladas e intimidou as razões avessas, seduzindo o vazio de uma noite monótona. O que ela não havia notado, ainda, é que o medo de amar estava fora de moda. A solidão já não voltara pra casa há dias e as letras de uma canção antiga tinham, agora, pronuncias de amor. Era tarde demais para sair em busca de outras explicações. Ela estava apaixonada.


Ana Carolina

quinta-feira, 6 de agosto de 2020

"Doer, dói sempre. Só não dói depois de morto. Porque a vida toda é um doer." ____________________________ _________________ Rachel de Queiroz


"Digo o que penso, com esperança. Penso no que faço, com fé. Faço o que devo fazer, com amor. Eu me esforço para ser cada dia melhor, pois bondade também se aprende. Mesmo quando tudo parece desabar, cabe a mim decidir entre rir ou chorar, ir ou ficar, desistir ou lutar; porque descobri, no caminho incerto da vida, que o mais importante é o decidir."

Cora Coralina

domingo, 2 de agosto de 2020

Chegou lindo o mês de agosto, trazendo consigo o oposto do que do reza a lenda do desgosto. _______________________________________ Edna Frigato

Para atravessar agosto é preciso antes de mais nada paciência e fé. Paciência para cruzar os dias sem se deixar esmagar por eles, mesmo que nada aconteça de mau; fé para estar seguro, o tempo todo, que chegará setembro — e também certa não-fé, para não ligar a mínima às negras lendas deste mês de cachorro louco. É preciso quem sabe ficar-se distraído, inconsciente de que é agosto, e só lembrar disso no momento de, por exemplo, assinar um cheque e precisar da data. Então dizer mentalmente ah!, escrever tanto de tanto de mil novecentos e tanto e ir em frente. Este é um ponto importante: ir, sobretudo, em frente. Para atravessar agosto também é necessário reaprender a dormir. Dormir muito, com gosto, sem comprimidos, de preferência também sem sonhos. São incontroláveis os sonhos de agosto: se bons deixam a vontade impossível de morar neles; se maus, fica a suspeita de sinistros augúrios, premonições. Armazenar víveres, como às vésperas de um furacão anunciado, mas víveres espirituais, intelectuais, e sem muito critério de qualidade. Muitos vídeos, de chanchadas da Atlântida a Bergman; muitos CDs, de Mozart a Sula Miranda; muitos livros, de Nietzsche a Sidney Sheldon. Controle remoto na mão e dezenas de canais a cabo ajudam bem: qualquer problema, real ou não, dê um zap na telinha e filosoficamente considere, vagamente onipotente, que isso também passará. Zaps mentais, emocionais, psicológicos, não só eletrônicos, são fundamentais para atravessar agostos. Claro que falo em agostos burgueses, de médio ou alto poder aquisitivo. Não me critiquem por isso, angústias agostianas são mesmo coisa de gente assim, meio fresca que nem nós. Para quem toma trem de subúrbio às cinco da manhã todo dia, pouca diferença faz abril, dezembro ou, justamente agosto. Angústia agostiana é coisa cultural, sim. E econômica. Mas pobres ou ricos, há conselhos — ou precauções — úteis a todos. O mais difícil: evitar a cara de Fernando Henrique Cardoso em foto ou vídeo, sobretudo se estiver se pavoneando com um daqueles chapéus de desfile à fantasia, categoria originalidade... Esquecê-lo tão completamente quanto possível (santo zap!): FHC agrava agosto, e isso é tão grave que vou mudar de assunto já. Para atravessar agosto ter um amor seria importante, mas se você não conseguiu, se a vida não deu, ou ele partiu — sem o menor pudor, invente um. Pode ser Natália Lage, Antônio Banderas, Sharon Stone, Robocop, o carteiro, a caixa do banco, o seu dentista. Remoto ou acessível, que você possa pensar nesse amor nas noites de agosto, viajar por ilhas do Pacífico Sul, Grécia, Cancún, ou Miami, ao gosto do freguês. Que se possa sonhar, isso é que conta, com mãos dadas, suspiros, juras, projetos, abraços no convés à luz da lua cheia, brilhos na costa ao longe. E beijos, muitos. Bem molhados. Não lembrar dos que se foram, não desejar o que não se tem e talvez nem se terá, não discutir, nem vingar-se ou lamuriar-se, e temperar tudo isso com chás, de preferência ingleses, cristais de gengibre, gotas de codeína, se a barra pesar, vinhos, conhaques — tudo isso ajuda a atravessar agosto. Controlar o excesso de informação para que as desgraças sociais ou pessoais não deem a impressão de serem maiores do que são. Esquecer o Zaire, a ex-Iugoslávia, passar por cima das páginas policiais. Aprender decoração, jardinagem, ikebana, a arte das bandejas de asas de borboletas — coisas assim são eficientíssimas, pouco me importa ser acusado de alienação. É isso mesmo; evasão, escapismos. Assumidos, explícitos. Mas para atravessar agosto, pensei agora, é preciso principalmente não se deter demais no tema. Mudar de assunto, digitar rápido o ponto final, sinto muito perdoe o mau jeito, assim, veja, bruto e seco.