segunda-feira, 31 de agosto de 2015

"Se fantasiava enchendo o tempo. Mas lhe faltava o acontecer da vida... Afinal, todos queremos no peito o nó de um outro peito, o devolver da metade que perdemos ao nascer." ________________________ Mia Couto.

Da vida não se espera resposta.

Orides Fontela
Sei o quanto custa os pileques de solidão, por isso volta e meia eu tenho vontades. Acontece esses repentes. Essa vontade de ser intimidada ficar vermelha de tanto ser olhada, sem enigmas, sem rodeios e ser convidada para algo bonito. Vontade de abrir a porta e dar de cara com o olhar certeiro e maroto de quem congela minhas ações. E no mesmo instante desfazer minhas malas como quem quer ficar para sempre no mesmo canto, no mesmo quarto sentindo o cheiro nas cobertas. Ver estrelas despreocupada, sonhando e deixar o vento noturno desalinhar o meu cabelo. Ser salva de mim mesma.Não posso negar o desejo imenso de desabitar o silêncio para ouvir uma voz me chamando de um nome charmoso qualquer. Misturar o gole de vinho com a saliva quente, sentir o frescor do generoso abraço, ficar nessa malemolência afetiva,enroscada nos desejos e ao cair da tarde, perceber que ainda é cedo para a vida la fora. Faz sol aqui dentro. 


sexta-feira, 28 de agosto de 2015

“Se meus olhos mostrassem a minha alma, todos, ao me verem sorrir, chorariam comigo.” _________________________ Kurt Cobain.



E mesmo sem entender, 

eu sinto, aceito e agradeço.

Nessa ordem.


Bibiana Benites
De vez em quando, alguns acontecimentos tendem a retornar e despertar dores. Talvez seja por isso que nunca os revisitamos. Lembrei-me aqui de uma citação de Tolstoy: “Eu queria movimento e não um curso calmo de existência. Queria excitação e perigo e a chance de me sacrificar por meu amor. Sentia em mim uma superabundância de energia que não encontrava segurança em nossa vida tranquila”. Há dores que precisam da nossa atenção. E por mais que a “dor doída” esteja presente no caminhar diário, há sempre sinais vermelhos nos aconselhando a ameaça do acidente. Propositei tantos sonhos que até esqueci-me de escrever e hoje se perderam nos sinuosos rios dos meus pensamentos. “Você está feliz?” é a constante pergunta que as pessoas me fazem. E elas sempre esperam que meus olhos brilhem e que minha boca profira: “Sim, estou!”. Até porque, quem ama quer ver a felicidade impressa no semblante do amado. Se eu contestar apenas com um “sim”, não terei razões suficientes para legitimá-lo. Sobre isso tive um insight e lembrei-me da canção Giz do Renato Russo: “Pra ser honesto sou um pouquinho infeliz!”. Por isso, todas as vezes que me indagam sobre minha felicidade, permito que um silêncio inunde e reverbere em meu ser. Só depois arremato: “sou uma eterna construtora da minha felicidade”. Adélia Prado já dizia: “Não quero pão, eu quero é fome”. Deus me livre do aprazimento que mata meus desejos! Que as dores dos meus dissabores me arrastem, instigue meus afetos a buscar o meu íntimo desejo: a busca pela essência da minha existência e da minha felicidade. É por isso que aqueles que tiverem a gentileza e a paciência de passear pelas minhas palavras buriladas e desfrutar dos meus rabiscos se tornarão cúmplices dos meus propósitos. Mas nada disso me impede de ser errante, transgressora, experienciadora de fracassos. Até que eu não descubra os enigmas dos caminhos que percorro, olhando em cada ato um significado maior, deixando que as dores me reencontrem continuarei a afirmar e cantar: Pra ser honesta sou um pouquinho infeliz!

Igor Pereira- Adaptado

quinta-feira, 27 de agosto de 2015

"Se nada nos salva da morte, pelo menos que o amor nos salve da vida"... ________________________ Pablo Neruda

"Paz aos olhos que me olham, e
risos aos corações que me acompanham."

Sirley Passolongo

Pois a vida é uma experiência dura, muitas vezes confusa, incompreensível e incerta; e reconhecer um abrigo no meio de tanta inquietude é acolher o tempo da clareza, em que tudo passa a ser suprido de sentido. Alguns amores nos salvam da vida. Por resgatarem quem somos depois que partes de nós mesmos são deixadas pelo caminho. Por fazerem de nossas cicatrizes parte de suas estruturas também. Por acolherem nossa história com delicadeza, transformando o que era imperfeito numa nova possibilidade. Por permitirem o encontro com a esperança, o cortejo com a fé. Por dividirem as angústias do existir, permitindo que nossos fantasmas sejam lapidados, nunca enterrados. O amor nos torna vulneráveis. Ainda assim, percebemos sua urgência quando compreendemos que a vida é uma faísca, um piscar de olhos entre o nascente e o poente de nós mesmos. Como diz a canção, "a vida tem sons que pra gente ouvir precisa aprender a começar de novo..." E descobrimos que começar de novo não significa retroceder, mas entender que não haverá mais de nós em cada esquina ou aeroporto. Que não há outro tempo em que estaremos juntos além do tempo presente que se descortina diariamente. Que não seremos melhores ou maiores além do que podemos ser nessas horas em que vivemos e permanecemos lado a lado. De vez em quando torna-se necessário fazer o caminho de volta para que o amor nos reconheça também. Desistir das corridas, dar trégua aos projetos 'imprescindíveis' , abandonar rotinas desgastadas pelo tempo, apaziguar o contrato com a pressa. Resgatar os laços, valorizar os momentos, perceber-se merecedor daquilo que não se toca nem se vê. Arriscar a travessia, suportar os desvios do percurso, desistir de antigas rotas, aplacar a saudade do que ainda está lá. O tempo leva embora de diversas maneiras, enquanto a vida traz sem grande alarde. Que haja lucidez. Lucidez para enxergar os presentes que recebemos e poucas vezes enxergamos. Lucidez para valorizar o que nos pertence de fato. Lucidez para aceitar o fim de um tempo e o começo de outro, diferente, mas nem por isso pior. Lucidez para acolher o que é verdadeiro, real e provido de sentido. Lucidez para amar e ser amado. Lucidez para finalmente permitir que o amor nos salve da vida...


Fabíola Simões

terça-feira, 25 de agosto de 2015

Pediste ao céu para que viesse rosa sem qualquer espinho. Não há rosas sem espinhos, amor. Serias então outra que não eu? E a primavera, entristecida, porque outra que não tua? ________________________ Guilherme Antunes

Segue então moça, firme, agarrada à sua fé.
E se eu for embora por instantes, seu gesto será de tristeza? Se eu for embora por instantes, não devolverei o afeto que até então me foi ofertado. Se eu for embora, prometa deixar a porta fechada para eu não titubear. E se for à tardinha, espero que o sol, em um ato de solidariedade, desbote no horizonte. Quero sair apressada, para não dar tempo às lembranças e fingir que tudo evaporou da memória. Não irei esfuziante e nem alardearei os motivos, aliás a única coisa acalentadora é que foi bom. Tivemos dias generosos, todavia mergulhamos em aflições. Nunca fomos proprietários de tranquilidade. Se eu for embora, irei lembrar das promessas de tonalidade que sentenciavam um horizonte feliz. Quando eu sair, será de uma forma despojada, sem contudo parecer livre. Farei apenas para não esgarçar a guardada felicidade. A propósito, o que será de mim quando sair? Continuarei com a habitual descompostura que me mantém viva. Nunca adiei a felicidade. Sei que ela foi decorrente das porções generosas da convivência, que um dia esqueceu de prosseguir a estrada colorida de girassóis. Então, nada mais se junta ou acumula. Não há investimentos dentro do peito. Sairei sem ruído. E se eu decidir ir, colecionarei coragem para chorar, lavando a alma, retirando o pó infinitas vezes ou até que se feche a ferida, cerzida de boas recordações. Finalmente batizarei essa vivência de um amanhecer para a vida.

segunda-feira, 24 de agosto de 2015

"Tenho me preocupado muito com o tempo. Quanto mais ele passa, mais ainda ele passa, e com ele, passo eu, passa tu, e onde ficamos nós? Estamos retidos. Detidos no coração egoísta das nossas fraquezas..." _________________________ (Be Lins)

Meu sentir é muito antigo pra toda
 essa modernidade que grita desapego


Nina Benavídez
Ao entardecer a vida se sublima, se entorpece, faz do pensamento um voo e vai. Ao entardecer o sentimento aflora, o coração reencontra sua feição amorosa, a mente busca uma asa qualquer e vai. Ao entardecer o vento vem trazendo canção, o olhar avista outonos e primaveras, a boca pede um cálice de vinho e o passo sobe na nuvem e vai. Ao entardecer avista-se a revoada, o barco que retorna ao cais, as ondas que chegam nervosas, as pedras que se molham afoitas e a gaivota que sai do ninho do sentimento e vai. Ao entardecer tudo é poesia, um bilhete de amor, uma carta saudosa, uma palavra não dita que se repete na voz e uma interrogação que estende seus braços e vai. Ao entardecer os coqueirais balouçam sua solidão, as conchas da areia contam seus últimos segredos, as águas avançam apagando passos e levando consigo a flor dolorosa deixada ao desvão. E tudo sai do ser e vai. Vai em busca de viver, de acontecer, de ser menos dor, ser menos tristeza, ser menos agonia. Vai sonhar um sonho de realização, de possibilidade, de fuga. Lá em cima um sol se pondo, lá no horizonte uma tela pintada com feição e olhar. E da janela, diante a vida que se estende lá fora, apenas a solidão que grita e não vai. Não vai embora porque precisa ser solidão de reencontro, de lembrança, de saudade, de nostalgia. Até que o amor chame o ser à felicidade e ele vá.


Rangel Alves da Costa

"Do lado de fora é que deve estar nosso lado de dentro." _____________________ Viviane Mosé

As horas passam, os homens caem,
 a poesia fica.

Emílio Moura

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Com versos inversos vivo por vezes no universo que para quem ama se faz perverso; Algumas vezes a palavra sai como uma bala, outras vezes o tiro não acerta a jarra; A prosa sai vagarosa, mas deve ser como os passos de uma mulher charmosa ou uma menina dengosa; O poema é um dilema, a tinta da caneta é pouca, mas não cria nenhum problema, elegante é escrever com uma pena como se fazia no antigo sistema, mas hoje qual o sentimento que vale a pena? A poesia é a abstração do tudo que ninguém vê, mas quem lê, sente e crê que essa arte faz tremer. Quem não escreve sustenta uma espécie de pobreza da alma, na mente falta calma e no coração o sangue passa sem razão, falta é muita emoção. Tente sentir a poesia em cada detalhe e deixe que sobre o resto o mundo trabalhe e verá que a sorte é alegria de prosa, poema e poesia todo dia.


VAMDS.

sábado, 22 de agosto de 2015

"Arranca metade do meu corpo, do meu coração, dos meus sonhos. Tira um pedaço de mim, qualquer coisa que me desfaça. Me recria, porque eu não suporto mais pertencer a tudo, mas não caber em lugar algum." ______________________ José Saramago

Meu coração é um livro
Com páginas de girassóis.

Nara Núbia Ribeiro
Sou normal em dias contados. Atemporal tão logo avisto o amor. Teimosa pela saudade do que desejei. Pão e poesia fazem o meu dia, mas também transito por outras guloseimas, tipo comer esperança, mesmo fragilizada, só para ter o prazer de dizer que sou otimista em relação ao amanhã, mas confesso que não sei bem se haverá chuva grossa ou apenas uma garoa no dia seguinte. Iludo-me acreditando que haverá sol. O futuro para mim sempre germinará como meus canteiros de girassóis. Deixará pelo menos alguns rastros de sua beleza, mesmo com os galhos nus. Tenho o destino na palma de minha mão, contudo ele é traiçoeiro ou sou míope e enxergo linhas fortes e definitivas nas marcas mal ajambradas da minha pele, outrora viçosa. 





Ita Portugal, Antes que me ame.

sexta-feira, 21 de agosto de 2015

Gosto dos ipês de forma especial. Questão de afinidade. Alegram-se em fazer as coisas ao contrário. As outras árvores fazem o que é normal – abrem-se para o amor na primavera, quando o clima é ameno e o verão está prá chegar, com seu calor e chuvas. O ipê faz amor justo quando o inverno chega, e a sua copa florida é uma despudorada e triunfante exaltação do cio.


Nos poemas bíblicos da criação 
está relatado que Deus, 
ao fim de cada dia de trabalho,
sorria ao contemplar o mundo que
estava criando: tudo era muito bonito. 
Os olhos são a porta pela qual 
a beleza entra na alma. 
Meus olhos se espantam 
com tudo que veem.

Rubem Alves

Uma professora me contou esta coisa deliciosa. Um inspetor visitava uma escola. Numa sala ele viu, colados nas paredes, trabalhos dos alunos acerca de alguns dos meus livros infantis. Como que num desafio, ele perguntou à criançada: "E quem é Rubem Alves?". Um menininho respondeu: "O Rubem Alves é um homem que gosta de ipês-amarelos...". A resposta do menininho me deu grande felicidade. Ele sabia das coisas. As pessoas são aquilo que elas amam.

Rubem Alves

quarta-feira, 19 de agosto de 2015

"Você está aqui apenas para uma rápida visita? Não se apresse. Não se preocupe. E não se esqueça de ouvir o canto dos passarinhos...

Sintonize aqui a Rádio Passarinho

"Seja Doce, sintonia é tudo."
Na língua dos pássaros uma expressão tinge a seguinte. Se é vermelha tinge a outra de vermelho. Se é alva tinge a outra dos lírios da manhã. É língua muito transitiva a dos pássaros. Não carece de conjunções nem de abotoaduras. Se comunica por encantamentos. E por ser contaminada de contradições a linguagem dos pássaros, só produz gorjeios.



(Manoel de Barros)

terça-feira, 18 de agosto de 2015

Sopra, vento, sopra, vento, ai, vento do mês de agosto, passa por sobre meu rosto e sobre o meu pensamento. Vai levando meu desgosto! ________________________ Cecília Meireles.

Coloque amor em tudo que fizer, 
se não der, coloque fé.

Ju Fuzetto.
E, de repente, a gente percebe que não é o mês que deve ser doce, mas sim nossas atitudes. Um punhado de riso, uma palavra que acalma, uma mão estendida e qualquer gesto que traga paz. Só isso nos faz ser melhor conosco e com os outros. Não coloque expectativas no colo de Agosto. É muita responsabilidade nas costas de um cara que fica por tão pouco tempo.

Ju Fuzetto

"Às vezes é tanta dor e tanto intenso que palavra nasce doendo, que o verbo nasce gritando, e o verso envasa o imenso em que o amor encontra-se lendo entre um porém e um entretanto." _________________________ Guilherme Antunes


Para atravessar um agosto inteiro,
 é preciso qualquer coisa que lembre força,
 insistência e amor.
Senão a gente não aguenta.

Bibiana Benites
Expectativa é teimosia antiga nossa, filho, em que exigimos aos agoras aquilo que não lhes cabe. É noite mal dormida para adiantar manhãs. A semente que no descaso à sua primavera quer no inverno vender seus próprios frutos. Um presente vivendo de futuro e o futuro vivendo já de romances. O cigarro que se apaga sem direito tragarmos. Devorar o relógio, o estômago, a paciência. Irmã rebelde das esperanças, expectativa é dispensa dos caminhos e apego às chegadas. Filha mais nova da ansiedade, é o disfarçado avesso das entregas.


Ali, meu filho, amor não resiste muito não.

domingo, 16 de agosto de 2015

Ventos de agosto---Sou chegada a declamar poesias para o vento, conversar com a noite, ficar sorrindo para as boas lembranças,viajar pelas canções e guardar um bocado de afeto como bônus para dias nublados. É que a vida não me pede sobriedade. _________________________ Ita Portugal.

Minha casa era caminho de um vento,

comprido, comprido que ia até o fim do mundo.
Manoel de Barros.

Ventos de agosto, trazem ares de profundas marcas. 
ventos de agosto, provam nossa existência. 
Ventos de agosto, arejam nossas mentes.
Ventos de agosto,
desequilibram nossa tranquilidade.
Ventos de agosto, transformam sementes em vida.
Ventos de agosto, chegam furiosos e se acalmam em quentes aragens.
Ventos de agosto, Podem desgostar, mas sinalizam vida. 


                                                                         Célia Rangel

sexta-feira, 14 de agosto de 2015

"Ela tinha nos olhos uma verdade bonita. Era imperfeita, mas tinha dentro dos olhos - ela tinha - a beleza de ser ela mesma, e de não gostar de fingir." _________________________ Rachel Carvalho

E do que precisamos?
Anote aí, é pouca coisa:
 silêncio, arte e amor.


Martha Medeiros.
“Há em nós a lucidez dos loucos, mas não daqueles loucos comuns que habitam este mundo em cada esquina. Somos da quota de loucos que não aceitaram suas prisões e que não entraram por liberalidade em suas gaiolas. Que não se amarraram ao outro com suas correntes. Somos da fração da loucura que abriu mão do dia-a-dia. Há em nós a rebeldia dos que não se contentaram com o peso da realidade e abriram suas porteiras na busca de alcançar o horizonte.”

Guilherme Antunes

quarta-feira, 12 de agosto de 2015

"Não sei exatamente em que momento comecei a despertar. O que sei é que não quero aquele sono outra vez." _________________________

Quis a moça desavisada
deixar seus encontros e querências
 todas nas mãos do destino.

Gui Antunes
"Não sei exatamente em que momento comecei a despertar. Só sei que comecei a lembrar de onde é o céu e a perceber que o inferno é onde a gente mora quando tudo é sono. Comecei a sair dos meus desertos. E a olhar, ainda que timidamente, para todas as miragens, sem tanto desprezo, entendendo que havia um motivo para que elas estivessem exatamente onde as coloquei. Nenhum livro, nenhum sábio, nada poderia me ensinar o que cada uma me trouxe e o que, com o passar do tempo, continuo aprendendo com elas. Dizem que só é possível entendermos alguns pedaços da vida olhando para eles em retrospectiva. Acho que é verdade. (...) Não sei exatamente em que momento comecei a despertar. Só sei que comecei a compreender o respeito e a reverência que a experiência humana merece. A me dar conta de delícias que passaram despercebidas durante um sono inteiro. E a lembrar do que estou fazendo aqui. Ainda que eu não faça. Ainda que os vícios que o sono deixou costumem me atrapalhar. Ainda que, de vez em quando, finja continuar dormindo. Mas não tenho mais tanta pressa. Comecei a aprender a ser mais gentil com o meu passo. Afinal, não há lugar algum para chegar além de mim. Eu sou a viajante e a viagem. (...) Não sei exatamente em que momento comecei a despertar. Só sei que não importam todos os rabiscos que já fizemos nem todos os papéis amassados na lixeira, porque todo texto bom de ser lido antes foi rascunho. E, por mais belo que seja, é natural que, ao relê-lo, percebamos uma palavra para ser acrescentada, trocada, excluída. A ausência de uma vírgula. A necessidade de um ponto. Uma interrogação que surge de repente. Viver é refazer o próprio texto muitas, incontáveis, vezes. Não sei exatamente em que momento comecei a despertar. O que sei é que não quero aquele sono outra vez."


Ana Jácomo

segunda-feira, 10 de agosto de 2015

“Moça, você tem alma colorida pintou as suas dores com tintas e plantou flores em suas feridas.” ____________________ — Aquarelismo

"Venha o vento que houver"

Sandra Costa
Hoje talvez não. Talvez hoje ainda vai te aumentar a vontade de querer morrer. Hoje você ainda vai se sentir idiota por ter respondido aquelas mensagens tão depressa; hoje você ainda vai se arrepender por ter colocado um apelido carinhoso no lugar do nome na agenda do celular. Hoje tudo isso e muito mais, mas amanhã não, porque amanhã vai ficar tudo bem. Vai levar um tempo até que o vento volte a beijar seu rosto ao invés de te cortar feito navalha. Vai levar um tempo para que as coisas que te faziam bem parem de te fazer mal. Vai levar um tempo até que você entenda que lutar contra é desperdiçar sua força. Você vai levar um tempo para encontrar um lugar pra lembrança ficar em você. Vai levar um tempo, mas o tempo vai levar e amanhã vai ficar tudo bem. Vai doer até mesmo pra esperar a margarina fixar completamente no pão pela manhã; e as voltas da colher misturando açúcar no café vão parecer intermináveis. Um monte coisa ainda vai te desequilibrar e, no fundo, você sabe que vai. E tudo isso só acontece porque você é de verdade. Você já passou por coisas parecidas antes. Você se frustra – e tem esse direito – mas sabe o quanto tudo isso faz parte. “Mas eu não sou obrigada a ter que ficar bem sempre, eu não esperava pelo que aconteceu!” – você tem toda razão ao pensar e se sentir assim. Você não deve fingir que está feliz enquanto se refaz aos cacos um por vez, mas você só vai melhorar quando aceitar. Hoje as coisas podem não estar tão boas e por isso os vídeos de bebês sorrindo não tem tanta graça, mas amanhã vai ficar tudo bem. Hoje as músicas que te relaxam serão a passagem para a sua saudade repleta de desejo de voltar no passado, mas tem um monte de refrão novo te esperando para você cantar gritando. Hoje você ainda vai ter que lidar com alguns fins. Vai ter que parar de seguir nas redes sociais, vai ter que desfazar amizade com alguns amigos, vai ter que deletar algumas fotos, vai ter que esconder ou atear fogo em alguns presentes; hoje você vai ter que passar por tudo isso, hoje você vai ter que se despedir para dar espaço a um novo olá, mas sabe, amanhã vai ficar tudo bem. Hoje você só precisa focar na paz para os seus dias. Hoje você precisa lembrar das contas à pagar; precisa lembrar que nenhum emprego aceita atestado de saudade pra faltar. Hoje você precisa lembrar que antes de ontem você já tinha muitos motivos para comemorar. Hoje você precisa lembrar do que já viveu de bom para se motivar a viver algo ainda melhor. Hoje você não precisa se preocupar com nome e sobrenome, não precisa medir suas palavras e muito menos precisa encontrar indiretas pra postar; hoje você só precisa compartilhar coisas que você gostaria de receber. Amanhã vai ficar tudo bem. Deixe de se olhar no reflexo do vidro no metrô e olhe para um novo e bom livro no seu colo. Deixe de procurar o que não deseja encontrar. Vai passar. Você nem vai perceber quando isso acontecer, só vai se dar conta quando não for mais da sua conta. Hoje vai ser difícil, no entanto convenhamos: não são todos os dias os nossos preferidos; respire devagar, tenha pressa somente em se alegrar, deite seu corpo e levante sua alma pois amanhã vai ficar tudo bem>

quinta-feira, 6 de agosto de 2015

“De quem seria o amor se não fosse dos loucos?” _____________________ — Sobre Amar, Enlouqueço

Olham-se. Tocam-se. Abraçam-se.
 Apaixonam-se. Amam-se.

Se é recíproco, tudo é mais fácil.

-Saulo Pessato
“Liberdade na vida é ter um amor pra se prender. A gente reclama muito da dependência, mas como é maravilhosa a dependência! Confiar no outro. Confiar no outro a ponto de não somente repartir a memória, mas repartir as fantasias. Confiar no outro a ponto de esquecer quem se foi, sem que o outro esteja junto. É talvez chegar em casa e contar seu dia e só sentir que teve um dia quando a gente conta como foi. É como se o ouvido da outra pessoa fosse nossos olhos. Amar é uma confissão. Amar é justamente quando o sussurro funciona muito melhor do que um grito...”

— Fabrício Carpinejar

quarta-feira, 5 de agosto de 2015

E não existe uma Flor, que não se renda a um Beija-Flor. ________________________ Torsh



Toda sensação de perda 

vem da falsa sensação de posse..." 

Gasparetto
"Maria Rendeira se rende a qualquer fio. Vive enrolada em vários ao mesmo tempo. Tece renda, borda vestidos, faz flores de crochê para os cabelos e tem um gatinho chamado Agulha, que dorme na cesta dos novelos de lã. Maria Rendeira, além de bordar e tricotar também gosta de filosofar. Sabe que a vida também é tecida fio a fio, e que o enrosco dos fios são como os desafios da vida, e que no bordado como na vida, às vezes a gente tem afrouxar o fio para poder continuar."

Fernando Coelho

segunda-feira, 3 de agosto de 2015

"Nunca fugi do amor. Confesso. Fiz dele a sorte do meu azar. Duvido dos amores fáceis. Dos que se ostentam em capa de revistas. Dos que não caem em tropeços e seguem em linha reta sem ter que nunca contornar. É antigo, eu sei. Mas, eu sempre sangrei amor. E me curei só para recomeçar." _______________________ PHAlmeida

"Caminhando e vivendo
com a alma aberta

Aquecidos pelo sol que
 vem depois do temporal"

TM
Prometo falhar.  Sem hesitar. Prometo ser humana, aqui e ali ser incoerente, aqui e ali dizer a palavra errada, a frase errada, até o texto errado, aqui e ali agir sem pensar, para que raios serve pensar quando te amo tão desalmadamente assim? Prometo compreender, prometo querer, prometo acreditar. Prometo insistir, prometo lutar, descobrir, aprender, ensinar. Tudo para te dizer que prometo falhar. E Deus te livre de não me prometeres o mesmo. E ela sentiu a respiração a faltar, hesitou como nunca tinha hesitado, quis pensar aquilo tudo, colocar todas as possibilidades nos pratos da balança, mas quando deu por si não disse «quero tanto mas deixa lá», quando deu por si estava a pensar em como conseguira deixar de pensar, um ou dois segundos de ela própria, o amor só existe quando nos oferece pelo menos um ou dois segundos de nós próprios.«Se voltas a falhar juro que te amo para sempre.»E ela falhou.

_______________________________________
in "Prometo Falhar" - bestseller, de Pedro Chagas Freitas

sábado, 1 de agosto de 2015

S.O.S: O amor é a nossa unica chance. _________________________ Fernando Coelho

Quando o médico a examinou, ficou perplexo. Nunca vira, assim, um caso tão grave. Os sintomas eram tantos! A menina não tinha mais sede de alegria, fome de contentamento. Padecia de inapetência da vida. Seguia no automático, como se viver fosse uma obrigação burocrática e o vivente um funcionário que aguarda soar o alarme da saída para bater o ponto final. Era meio desligada, desapercebida do mundo. Algumas coisas, contudo, a incomodavam bastante. Uma delas era a lentidão das horas. Era imperioso que dia terminasse logo. Um dia a menos: missão cumprida. Outro incômodo era a pressa de todo mundo por alcançar uma porção de coisas sentido. E depois que as pessoas alcançavam “o-seu-sem-sentido-da-vez”, corriam a forjar outras metas ainda mais estranhas e descabidas, como a fama pela própria fama, o ter o desnecessário, o possuir em esbanjamento o que ao outro falta, o dominar o outro, o apropriar-se do trabalho alheio sem a justa contrapartida.”Estou, sim, a viver. Tenho este pedaço de vida — disse, apontando um novo caderninho — quase a meio.”Mia Couto, no conto “O menino que escrevia versos”.Esse incômodo tinha um agravante máximo que, penso eu, foi o que de fato a adoeceu. É que essas pessoas se arvoram na autoridade de ditadores das regras do mundo e exigiam que a menina também agisse assim. Mundo insano que a alma golpeia e de ninguém compadece! Os parentes se preocuparam imensamente pela desimportância que a menina dava às coisas sérias do mundo. Imagina, ela era capaz de perder tempo olhando as formigas no quintal enquanto o jornal da noite dava notícias de severas ocorrências políticas. Gostava de ficar horas em silêncio, sozinha, como se quisesse ouvir alguma vez que vem de dentro. Não tinha ambições maiores, falava com pouca gente (por falta de afinidade, mesmo)… E a solidão a assumiu por completo. Mesmo quando cercada de pessoas, ela estava sozinha. Isso era certo. A tristeza foi se acumulando na alma. Se ninguém a aceitava do jeito que ela era, ela se deu ao luxo de também se rejeitar. Até que a situação chegou a um ponto insustentável. Ela estava fraca e abatida. Há dias não ia ao trabalho ou à escola, não comia, não saía do quarto. Seus pais decidiram levá-la ao médico, temerosos de um mal maior. – É um caso gravíssimo, asseverou o médico. – A menina padece de excesso de abstrato no peito, palavras petrificadas na alma, utopias invencíveis, encantamentos intocados. Tem nas entrâncias, devidamente resguardas, as dores do mundo e nutre tendência às desimportâncias. É alérgica a vacuidades pomposas e a vaidades diversas. Ela corre risco de morte. Os pais não entenderam absolutamente nada, mas ficaram atônitos quando ouviram a palavra “morte”. – O que podemos fazer, doutor? Ela tem cura? Diga, pelo amor de Deus, diga! – Incurável. A mãe chorava copiosamente. – Podemos ajudar de que modo, Doutor? – Caneta e papel em dosagens desmedidas. Em casos de poesia crônica, escrever é sempre a única receita, a única alternativa.




Nara Rúbia Ribeiro