quinta-feira, 26 de julho de 2018

Isso de querer ser exatamente aquilo que a gente é ainda vai nos levar além. __________________________________ Paulo Leminski

julho/ 2018
Tem dias que acorda tão ela mesma, que se assusta consigo. Levanta arrastada, forçando o pensamento a ser positivo e expulsando a preguiça que corre nas veias. A primeira pessoa que vê, ao acordar, é ela. Encara-se num espelho de dois metros de altura: rosto amassado, cheiro de sono, pele limpinha. Pés de galinha quando os olhos sorriem. Pijama. Amanhece mais dentro de si: sendo o que for, amando como quer, vivendo como deseja – sem o ensejo de querer agradar ninguém, salvo à si. É um tanto raro isso: acordar com olhos sorrindo. Dança enquanto a rotina desenrola. Arruma seus fios de cabelo, emoldurando-lhe a face. Pinta o rosto, sem querer se esconder de ninguém: a cor só ressalta os traços que o sono desenhou durante a noite. Não há corretivo que expulse os sonhos dos olhos. Não há máscara que esconda o que a noite esculpiu. Ela rodopia em frente ao espelho, feito bailarina descoordenada, sobre suas sapatilhas pretas. O azul tornou-se fiel companheiro de todos os dias. O relógio tiquetaqueia com a pressa de uma criança frente à um brinquedo novo muito colorido. O café esquenta o dia já quente. Risca o asfalto, olhando a volta. Olhando em volta. Olhando o tudo e o nada. Atualiza-se dos assuntos banais.  Abre o quebra-sol e se olha, e se ajeita e pinta a boca de cor de rosa. E está tão ela mesma, que se assusta consigo. Está tão ela mesma, que tem o riso nos olhos. Está tão ela mesma, que o relógio não assusta. Tão sendo ela e só ela e do jeito dela, que o mundo e os estereótipos e a sociedade, pouco importam.


Mafê Probst

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