Inaugurou um novo capítulo: uma garoazinha de tristeza, uma saudade entreaberta,
e o vento aborrecido. Sudoeste querendo abraçar tudo. E ela vagueando por aí sem
nenhuma palavra que arranhasse o silêncio. O tempo contido nas coisas, os dias
aprisionados na ansiedade já não deslizavam pelo calendário. Esperança já nem
suspirava. Não havia espera de nada, apenas a companhia corriqueira: ela e a
solidão_ mão com mão, rostos sem face. Já não desejava amores nem intrigas de
paixão alguma: sossegou-se na solitude aceitando aos poucos o tempo alargado
para se preencher com improvisos, sem horários rígidos, sem avisos. Preencheu de
paz o espaço novo do coração esvaziado.(Dizem que a Primavera chega trocando a
roupa da paisagem). E no auge da sua descrença o dia amanheceu de novo. Quando
não queria mais fugir de si mesma, foi surpreendida por uma voz de timbre limpo,
olhos atenciosos e mãos que diziam coisas. Era alguém que tranquilizava quando
apenas sorria. Uma pessoa que trazia em si o amparo de tudo. Tinha o dom da
conveniência e da clareza e pronunciava reciprocidade. O fato resumindo é que o
amor não era mais aquele estardalhaço. O amor era suave e tinha um jeito de
penetrar sem invadir, de libertar no abraço. O amor não era mais aquela insônia,
mas sonho bom na entrega ao desconhecido. O amor não era mais a iminência de um
conflito, mas uma confiança na vida. E, pela primeira vez, o amor não carregava
resquícios de abandono, pois havia descoberto: o amor estava ali porque ambos
estavam prontos.
(O Tempo estava certo.)
* Marla de Queiroz Do meu livro QUANDO AS PALAVRAS SE ABRAÇAM. (vendas pelo direct. Envio com dedicatória